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Jurisprudência defensiva e a Função dos Tribunais Superiores

Fernanda Farina - 01 de julho de 2012


Revista de Processo | vol. 209/2012 | p. 105 | Jul / 2012 ​

Sumário: 1. Introdução – 2. Função dos Tribunais Superiores: 2.1 “Supreme Court” americana; 2.2 Recursos extraordinários – 3. Crise dos Tribunais Superiores – Um panorama – 4. Jurisprudência defensiva: 4.1 Súmula 284 do STF; 4.2 Guia de recolhimento do porte de remessa e retorno no STJ; 4.3 Conclusão – 5. Repercussão geral como uma possível solução – Também no recurso especial: 5.1 Origens da repercussão geral; 5.2 Aplicação da repercussão geral ao recurso especial – 6. Conclusão – 7. Referências bibliográficas.

1. Introdução

Dois dos cinco Tribunais Superiores legitimados pela Carta Constitucional de 1988, o STF e o STJ, têm funções constitucionais bastante semelhantes.

Aquela que certamente os define como Cortes Superiores, e mais do que isso, Cortes Extraordinárias, é a de proteção e uniformização do Direito pátrio, seja no texto da Constituição Federal, seja nas leis federais infraconstitucionais.

A missão relevantíssima dos Tribunais Superiores de uniformização e proteção do Direito objetivo, com a finalidade de garantir a isonomia do cidadão na Lei, tem sido impedida pela crise de eficiência que os acomete – um número de recursos de altíssima expressão, que inviabiliza a produção sistemática e eficiente de julgados com a importância de uma decisão de Corte Superior.

Ante o número exorbitante de processos represados, os Tribunais Superiores têm se utilizado de forma irracional e ampliado o leque de aplicação de entendimentos jurisprudencias e súmulas que significam óbices ao conhecimento dos recursos extraordinários.

A essa barreira procedimental dá-se o nome de “jurisprudência defensiva”.

Esse é o fenômeno que esse artigo procura entender e criticar, tendo como pressuposto de análise a função constitucional dos Tribunais Superiores.

Além disso, busca-se analisar a repercussão geral – instituto adotado pelo STF importado da experiência norte americana (writ of certiorari) – como uma possível solução efetiva, ou ao menos um alívio, à crise dos Tribunais Superiores, e que não signifique distorcer regras processuais e enrijecer o sistema de normas procedimentais burocráticas.

Para tanto, o artigo utiliza-se da experiência americana como base de comparação e compreensão do nosso sistema. Ainda, analisa criticamente dois exemplos de “jurisprudência defensiva” aplicadas com recorrência significativa no STJ, e que se desviam demasiadamente da função e objetivo dos recursos extraordinários.

2. Função dos Tribunais Superiores

A partir da Constituição Federal de 1988, o Brasil passou a ter cinco Tribunais Superiores: O STF, o STJ, o TST, o TSE e o STM.

Nesse artigo tratamos dos dois deles: o STF e o STJ. Tribunais estes que possuem funções substancialmente parecidas.

A semelhança desses dois Tribunais reserva-se exatamente na sua função. Embora destinados a resguardar normas juridicas de natureza bastante diversas, ambos tem como missão a proteção do Direito objetivo na homogeneidade de sua interpretação e aplicação. Ademais, representam uma função política importante, da qual trataremos mais adiante.

Não poderia ser diferente, afinal, o STJ surgiu na Constituição Federal de 1988 como um verdadeiro desdobramento do STF,[1] para realizar a atribuição que antes era destinada ao STF: zelar pela uniformidade na interpretação da lei federal infraconstitucional.

Nas palavras de José Ignacio Botelho de Mesquita, de forma metafórica e bastante esclarecedora:

“Na consideração deste contexto, o constituinte de 1988 dividiu em duas a finalidade do recurso extraordinário, separando a matéria constitucional da infraconstitucional, e, com os elementos daí extraídos, criou o recurso especial e atribui o seu julgamento ao STJ. Um ato de criação como o descrito na Bíblia: ‘E da costela que tinha tirado Adão formou o Senhor Deus uma mulher, que Ele apresentou. Então disse Adão: eis aqui agora o osso dos meus ossos e a carne da minha carne’. Nunca mais voltou Adão a ser o mesmo. Nem o STF. Iniciado o caminho que o conduziria à expulsão dos jardins do Éden, teve início a tensão inseparável do ato de fazer, de um, dois, que nunca mais terminou, tornando difícil, sob sua influência, o desenvolvimento da nova criatura” (Mesquita, 2008, p. 358).

É por tal motivo, ante a semelhança das funções desses Tribunais Superiores decorrente de sua gênesis, que se torna útil e adequado analisá-los conjuntamente.

O texto constitucional traz, em seu art. 102, a missão do STF, in verbis: “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição Federal”.

Nos incisos que seguem o citado caput, o constituinte definiu as competências do Pretório Excelso. Nos incs. I e II, tratam da competência ordinária do Tribunal, que, com exceção dos remédios constitucionais, não lhes define a função primordial, porquanto mais relacionados a aspectos de organização política e judiciária, bem como questões relativas a foro privilegiado.

A real missão do Supremo reside no inc. III do art. 102, nos remédios constitucionais e na ação de inconstitucionalidade. O inc. III dispõe que compete ao STF: “julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decidas em única ou última instância quando a decisão recorrida: (a) contrariar dispositivo desta Constituição; (b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; (c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; (d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal”.

Assim acontece, também, com o STJ.

O art. 105 da Carta Maior define a competência do STJ, residindo sua função primordial no inc. III: “julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: (a) contrariar tratado ou lei federal ou negar-lhes vigência; (b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; (c) der a lei federal interpretação divergente que lhe seja atribuído por outro tribunal”.

Verifica-se, portanto, que tanto o Supremo quanto o Superior Tribunal tem como missão principal afastar eventuais decisões que contrariem, respectivamente, a Constituição Federal e a legislação federal infraconstitucional, bem como sanar eventuais divergências de interpretação dos tribunais do país com relação ao Direito objetivo que tutelam.

Essas funções relevantíssimas são exercidas por meio dos chamados recursos extraordinários. No STF, o recurso extraordinário leva o próprio nome, enquanto no STJ é batizado de recurso especial.

Com base neles farse-á a análise da função dos Tribunais Superiores.

2.1 A Suprema Corte Norte-Americana

É impossível realizar-se uma análise [crítica] da função dos Tribunais Superiores do Brasil, sem que se faça um paralelo com a Supreme Court dos Estados Unidos da América.[2]

A Constituição dos Estados Unidos da América foi o paradigma utilizado pelo nosso constituinte quando da primeira Carta brasileira, datada de 1824, mas também, e especialmente, quando da instituição da República. Aliás, a Lei Maior americana foi paradigmática para todos os países latino-americanos, cujas repúblicas se organizaram como verdadeiros espelhos dos EUA.

Todas as seguintes Constituições Federais que vigoraram no Brasil, inclusive a atual, trouxeram uma carga importante daquilo que preconiza a Constituição dos Estados Unidos. Com ela, inarredavelmente foi importada a figura e a função da Suprema Corte Federal.

Primeiramente, portanto, façamos breves comentários sobre a estrutura e evolução da Corte americana.

Uma peça importantíssima da democracia americana está assentada na figura da Supreme Court. O sistema jurídico dos Estados Unidos é, antes de tudo, judicial, e por isso a Corte Suprema americana é o Poder responsável por dar as diretrizes do que no Brasil representa a Lei escrita.

Ensina Adhemar Ferreira Maciel que antes da criação dos tribunais regionais federais em 1891, a Suprema Corte americana absorvia todos os litígios interestaduais, atuando como verdadeiro “tribunal de revisão”.

Durante os primeiros 100 anos de atuação da Supreme Court, portanto de 1789 a 1891, ela não possuia o poder discricionário de decidir quais casos julgaria. A regra era do recurso obrigatório (mandatory appeal). Mas, com o decorrer dos anos, devido à industrialização e modernização do país, o número de processos na Suprema Corte cresceu imensamente, chegando a um ponto de improdutividade e atrasos demasiados no julgamento.

Em 1891, frente à crise de eficiência da Supreme Court, por meio do chamado “Evarts Act”, foi-lhe dado pode discricionário com relação ao conhecimento dos recursos, implementado o chamado writ of certiorari. Essa atitude reduziu bastante o número de processo, mas não solucionou o problema.

Então, em 1988, o Congresso americano eliminou a maior parte da competência da Suprema Corte para recursos obrigatórios, restringindo-os significativamente. Os recursos originários para a Suprema Corte (mandatory appeals) foram praticamente extintos, ficando apenas residualmente naqueles que envolvam direitos indisponíveis. Todas as demais matérias, a partir de então, e até hoje, tem de ser submetidas por meio da petição de certiorary.[3]

Hoje, portanto, a Supreme Court restou com o papel eminentemente político e social. Ela é antes de tudo um Poder, de importância equiparável ao Executivo e Legislativo.[4][Eloá1]

A função fundamental da Suprema Corte dos EUA é de determinar o que é ou não constitucional, balizando as normas jurídicas e os atos administrativos a seus princípios e primados. É também eminentemente política por controlar efetivamente as políticas públicas e pautar as liberdades civis.[5]

Conforme se verifica da evolução da Suprema Corte dos EUA, foi-se adotando no decorrer dos anos a função primordial de garantia do real desenvolvimento do Estado Democrático de Direito: resguardar a Constituição e seus primados, adequando as políticas públicas e as liberdades civis aos princípios e ditames determinados na Carta Maior.

É em vista desse objetivo maior, soberano, que a Supreme Court restringiu em muito o rol de causas e casos por ela analisados, conforme veremos adiante quando da discussão da importância da repercussão geral.

E é essa a relevância que se tem de dar às nossas Cortes Superiores: a de resguardar o texto Constitucional e a legislação federal, e zelar pela observância dos princípios democráticos neles encerrados. Mais do que isso, é identificar que as Cortes Superiores, como a Supreme Court americana, tem essecial função política.

Ante tal função primordial que advém a impossibilidade de se assoberbar os Tribunais Superiores com matérias restritas à coisa privada, que não importam ao “interesse público” e não interessam à socidade como um todo.

2.2 Recursos extraordinários

Conforme dito anteriormente, realizaremos um corte metodológico para analisar tão somente os recursos extraordinários, como representativos da função primordial dos Tribunais Superiores.

Denomina-se recursos extraordinários àqueles aos quais a Constituição Federal destinou a função de proteção e uniformização da interpretação do Direito, constitucional e federal.

Os recursos extraordinários buscam a tutela do direito objetivo,[6] diferentemente dos demais, ditos “ordinários”, que, na concretização do princípio do duplo grau de jurisdição e da ampla defesa, permitem a rediscussão, em maior ou menor escala, do direito subjetivo das partes, do mérito. E mais do que isso: fazem disso o seu bojo – o que não acontece nos extraordinários.

Nas lições de Ovídio Araújo Baptista da Silva:

“Além disso, nosso recurso extraordinário, como o writ of error do direito americano, são instrumentos jurídicos marcados pela modernidade, forjados, ambos, na cultura europeia dos séculos XVII e XVIII, a expressarem a pesada influência do Iluminismo. Além disso, no caso brasileiro, o parentesco do recurso extraordinário com os juízos de cassação, nascidos da Revolução Francesa, não pode ser esquecido.

(...)

Como se sabe, o recurso extraordinário visa a assegurar a inteireza do direito federal, velando para que os tribunais ordinários o apliquem seguindo critérios uniformes.

Torna-se, portanto, claro que o sistema processual brasileiro não confere a nossos magistrados qualquer poder discricionário na aplicação do direito. A ‘uniformidade’ na aplicação do direito é uma exigência dos sistemas jurídicos modernos que, ao contrário das vertentes romanas, afastam-se do ‘caso’, rumo ao normativismo, na direção das normas abstratas” (Baptista da Silva, 2008, p. 486-487).

E nas palavras de Humberto Theodoro Júnior:

“Nesse panorama, um capítulo peculiar é aquele que trata da temática recursal, especialmente daqueles meios de impugnação das decisões direcionados aos tribunais superiores, ou seja, aqueles recursos de estrito direito (recursos extraordinários) nos quais não se abre a possibilidade de rediscussão de matéria fático-probatória. Fala-se de recursos para os quais, tradicionalmente, se diz não cuidar de corrigir a ‘injustiça’ da decisão, mas, somente, garantir a integridade da Constituição e leis federais e/ou a uniformidade da jurisprudência. Em função de um e de outro objetivos, se justificam as várias reformas pelas quais aqueles têm passado” (Theodoro Júnior, 2009, p. 10).

Assim, não se realiza nos recursos extraordinários, o duplo grau de jurisdição, não podendo tratá-los como mais um recurso dito “ordinário”.

Enfatizam tal visão Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery, quando afirmam que “trata-se de forma excepcional de recurso, não configurando terceiro ou quarto grau de jurisdição” (Nery Junior; Nery, 2006, p. 279). E, na mesma linha, Luiz Fux: “O recurso ora em exame tem como escopo a tutela imediata do direito objetivo, da ordem jurídica e, mediatamente, do direito da parte vencida com transgressão da norma constitucional” (Fux, 2008, p. 286).

Dessa forma, os recursos extraordinários, em atenção à experiência americana, caracterizam-se mais como uma decorrência da política federalista da nação, no interesse de manter o Ordenamento Jurídico coeso, e de realizar, de forma mais ampla, o princípio da isonomia e da impessoalidade da jurisdição, do que uma maneira de ataque das partes, irresignadas com a decisão do julgador a quo, em reformá-la.

“(...) sempre que os tribunais discordam sobre a interpretação da lei, sempre que os órgãos fracionários das cortes dissentem quanto à aplicação da lei, sempre que os juízes destoam dos tribunais aos quais, funcionalmente, estão subordinados, instaura-se uma crise, que acaba afetando direta ou indiretamente, toda a sociedade. Cumpre ao Estado, portanto, na busca de um processo que pretenda cumprir, entre outros escopos, o educativo, estimular os meios de sanar esta verdadeira perturbação que o dissenso tende a provocar” (Carmona apud Parente, 2006, p. IX).

Obviamente que, por não se tratar de cortes de cassação, como acontece nas experiências europeias, não se dissocia completamente a questão de Direito objetivo do mérito da demanda.

O direito subjetivo da parte recorrente deverá ser analisado pelos Tribunais Superiores quando do julgamento de seus recursos.[7] Ele é o condutor da questão constitucional ou federal levada ao conhecimento do STF e do STJ, e portanto será analisado e julgado, mas em função dela.

Nesse sentido, afirma Humberto Theodoro Júnior que:

“Não se pode negar que mesmo no âmbito europeu é recorrente a afirmação de que o papel dos tribunais superiores, notadamente das Cortes Supremas, seria o de garantir a uniforme aplicação da normatividade e dos direitos fundamentais e não o de se apresentar como um juízo de terceira instância.

No entanto, não há possibilidade de se estabelecer um paralelo acerca do papel dessas Cortes de Sobreposição europeias com o papel de nossos tribunais superiores, uma vez que não contamos no Brasil com tribunais de cassação, mas com tribunais que realizam o rejulgamento das causas.

Como informa Panzarola, na tradição das Cortes de Cassação europeias, o tribunal anulando a decisão não julga, mas promove o reenvio da causa a outro órgão jurisdicional que promoverá a aplicação da tese jurídica exposta pela Corte em face das peculiaridades do caso. Já em nosso regime constitucional a competência dos tribunais superiores inclui a de reanálise jurídica da causa.

(...)

Já no Brasil, o recurso extraordinário (e também o especial) destina-se tanto a invalidar o julgamento impugnado como, se necessário, a rejulgar a causa. Vale dizer: entre nós, o STF e o STJ têm poder tanto de cassação como de revisão do julgamento da causa” (Theodoro Júnior, 2009, p. 10).

Não é outra conclusão a que se chega quando da leitura da Súmula 283 do STF, in verbis: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles”.

Ora, a lógica desse enunciado sumular é exatamente de evitar que o recurso extraordinário torne-se obsoleto ante a manutenção de um dos fundamentos do acórdão recorrido, inatacada pelo recorrente.

“Com efeito, o recurso há de ser útil para a parte, ou seja, possível de trazer-lhe algum benefício, para que se possa dizer ter o recorrente interesse em recorrer. Esse benefício ou essa vantagem deve consistir numa melhoria da situação processual do recorrente, caso seu recurso seja provido, ainda que parcialmente.

Ora, se a decisão do Tribunal a quo encontra-se amparada em mais de um fundamento, não complementares entre, si, mas suficientes, autonomamente considerados, para sustentar a conclusão do julgamento, o recurso que se pretenda interpor atacando apenas um ou mais desses fundamentos, mas não todos aqueles em que se apóia a decisão, não pode trazer qualquer benefício para o recorrente, já que, ainda que provido o recurso no que respeita ao fundamento impugnado, a conclusão ainda se manteria pelos demais, que não foram objeto de recurso, ou em relação aos quais o recurso não é cabível.

Assim, não havendo utilidade para a parte a interposição do recurso contra a decisão apenas por aquele fundamento, trata-se de hipótese de falta de interesse em recorrer” (Pinto, 1991, p. 97).

Se o julgamento dos recursos extraordinários se desse tão somente sobre a questão de Direito objetivo, isoladamente – como se faz na Itália, em recurso privativo do Ministério Público – então o STF não teria que se preocupar com o interesse recursal da parte, conforme preconiza o texto da Súmula 283.

Isso significa, portanto, que o mérito da demanda sempre será analisado e julgado pelas Cortes Superiores, como forma de levar a questão de Direito objetivo ao seu poder uniformizador.

Insta frisar, ainda, que reforma da decisão do caso concreto (do mérito) se dá tão só como uma consequência do julgamento dos recursos extrordinários. A casuística não pode ser o motivo da atuação dos Tribunais Superiores, mas tão somente o transporte da questão legal a ser uniformizada por eles.[8][Eloá2]

“Assim, através dos recursos especial e extraordinário busca-se a uniformização da interpretação da lei federal ou a guarda da Constituição Federal, evitando-se a persistência de decisões que adotem orientações diferentes acerca de uma mesma regra ou princípio jurídico de direito constitucional ou de direito federal infraconstitucional.

Nota-se, pois, que os recursos extraordinário e especial ligam-se à ideia de federalismo, forma adotada pelo Estado Brasileiro (arts. 1.º e 18 da CF/1988) (Medina, 2009, p. 19).

São dois os tipos de recursos extraordinários no ordenamento brasileiro: o recurso extraordinário, por excelência, e que leva o mesmo nome, cuja tramitação se dá no STF, e o recurso especial, julgado pelo STJ.

Conforme mencionado, tais recursos surgem no ordenamento com o fim específico de resguardar e uniformizar a interpretação de normas constitucionais e infraconstitucionais, respectivamente no STF e STJ.

Trata-se de uma decorrência da forma como o ornamento jurídico brasileiro está organizado, e como é necessário que o Estado, observando o princípio da isonomia perante a Lei, garanta a mesma aplicacão da legislação para todos os integrantes da nação.

Ora, como poderia um cidadão, no Amapá, ser tratado de forma diversa do cidadão de São Paulo na aplicação da mesma norma jurídica federal? É o que poderia ocorrer se deixassemos a cargo tão somente dos Tribunais regionais a interpretação do ordenamento.

Cassio Scarpinella Bueno explica:

“Trata-se, bem da verdade, de uma consequência inarredável ao sistema político nacional: a federação pressupõe a uniformidade da aplicação e na interpretação das normas de direito federal em todo o território, até mesmo por força da isonomia e da impessoalidade que deve presidir as relações entre Estados e particulares (arts. 5.º, caput, 37, caput, e 150, II da CF/1988). Não é outra a razão pela qual o modelo que inspirou, historicamente, o nosso legislador, a conceber um recurso extraordinário nos moldes alinhavados foi o norte americano e o seu writ of error” (Bueno, 2008, p. 237-238)

E, Luiz Fux acrescenta:

“Deveras, os pressupostos jus-políticos do recurso extraordinário decorrem do fato de que a necessidade de se instituir recursos de decisões de tutela ‘imediata’ da ordem jurídica. Isto por que, o sistema federativo brasileiro, que se inaugurou com a república, como é sabido, prevê a autonomia tripartite das unidades federativas. Sob o ângulo que nos interessa, essa autonomia implica a existência de várias fontes legislativas e jurisdicionais, potencializando a possibilidade de confronto entre as leis e decisões locais com os comandos superiores da Constituição Federal. Noutras palavras: a unidade federada, através de sua legislação ou através de sua jurisdição, pode produzir leis e decisões que confrontem com a Constituição” (Fux, 2006, p. 286-287).

Esse modelo de federalismo, norte americano por excelência, caracteriza-se por uma autonomia, especialmente no que diz respeito à capacidade normativa de cada estado, e suas respectivas divisões de competência determinadas pela Carta Maior – em maior ou menor escala, dependendo da opção política de cada nação. Possuímos, assim, uma autoridade estadual, e uma autoridade federal, devendo, esta última, unificar os demais membros em uma só federação.

Esse modelo, entretanto, gera alguns problemas, conforme aponta José Miguel Garcia Medina:

“Distribuindo a Justiça dessa maneira, é praticamente impossível que haja uniformidade de entendimento acerca do direito federal perante todos os tribunais locais. Daí a necessidade de criar um meio através do qual se possa alcançar a unidade de interpretação do direito federal aqui compreendidas as normas constitucionais e as normas federais infraconstitucionais” (Medina, 2009, p. 21).

Os EUA utilizaram-se, diante desta problemática, do mecanismo batizado de writ of error, originalmente utilizado para rediscussão das questões de mérito dos recursos mediante aplicação da uniformização, para, a partir do Judiciary Act de 1789 (Section 75), criar um instrumento destinado a “sustentar a supremacia da Constituição e a autoridade das leis federais, em face das injutiças dos estados membros” (Baptista da Silva, 1963, p. 29).

Temos, portanto, um esforço do Estado em adequar a aplicação da legislação federal por meio de um mecanismo instituído nas Cortes Superiores, e não a criação de mais um novo recurso “ordinário” que dá às partes, indiscriminadamente, o poder de rediscutir as questões que lhes envolva.

Assim, nas palavras do Juiz americano Story, decidindo o caso que discutiu, na Supreme Court americana, a possibilidade de aplicação do Ato de 1789:

“Outro motivo, perfeitamente compatível com o mais sincero respeito aos tribunais estaduais, poderia ainda induzir a outorga da alçada de recurso contra as suas decisões. Esse motivo é a conveniência e mesmo a necessidade de uniformizar, em todo o território dos Estados Unidos, as sentenças, sobre os assuntos da esfera da Constituição. Juízes de igual ilustração e integridade poderiam, em diferentes Estados, interpretar diferentemente uma lei, um tratado ou a própria Constituição dos Estados Unidos. Se não houvesse autoridade revisora para corrigir essas decisões colidentes e discordantes, as leis, os tratados e a Constituição dos Estados Unidos, seriam diferentes em diferentes Estados e nunca poderiam, talvez, receber, em dois Estados, a mesma interpretação ou ter a mesma obrigatoriedade e eficiência. O prejuízo público, que tal estado de coisas acarretaria, seria verdadeiramente deplorável; e não se pode crer que haja escapado à ilustrada Assembleia que elaborou a Constituição.” (Case Martin v. Hunter’s Lesee, Reports, Book VI: 107/108 citado por Medina, 2009, p. 23).

Na realidade, toda a questão de uniformização do direito, nos leva a uma outra questão importante sobre o ordenamento jurídico atual, e que acomete diversas jurisdições ao redor do mundo: a crescente utilização da jurisprudência como fonte do direito, e, mediatamente, de preenchimento de lacunas legais.

Notamos em quase todos os ordenamentos modernos uma tendência a esta decodificação, na passagem para um direito mais dinâmico, focalizado nas decisões judiciais, ao invés de uma interpretação restrita ao texto legal. Este dinamismo é claro, e talvez até mais adequado às sociedade modernas, que se modificam com uma velocidade incrível. Pois, é exatamente essa transformação da sociedade que é de difícil absorção pela legilação. O legislador, fica, de certa forma, engessado pelo modo como os sistemas codificados se caracterizam, e pelo modelo como produção a legislativa está definida.

É exatamente para permitir que o direito não esteja sempre alheio às modificações da sociedade, que se tem optado por modernizar o sistema jurídico com base nas decisões judiciais, ampliando-se a interpretação do direito por meio dos olhos do magistrado que, assentado nas normas e princípios constitucionais, pode observar o mundo fático, concretizando o direito positivado, e, consequentemente, modernizando-o.

O descompasso da Lei em relação às modificações da sociedade fica bastante claro quando observamos um exemplo de direito posto: o art. 215 do CP.

Tal dispositivo, criado em 1940, no bojo do diploma penal, tratava dos crimes de posse sexual mediante fraude, e trazia no seu texto a expressão “mulher honesta” para descrever o sujeito passivo do delito. Só poderia, segundo esta redação legal, ser vítima de posse sexual mediante fraude, “a mulher honesta”.

Essa redação só foi modificada em 2005! Os tribunais, entretanto, já entendiam há bastante que qualquer mulher poderia ser alvo de posse sexual mediante fraude, independentemente de sua situação matrimonial, já que a definição de “mulher honesta” ficava restrita a uma sociedade antiquada, e machista.

Nesse sentido, notemos o anacronismo da explanação de Nélson Hungria, em 1981: “não somente aquela cuja conduta, sob o ponto de vista da moral, é irrepreensível, senão também aquela que ainda não rompeu com o minimum de decência exigido pelos bons costumes” (Hungria, 1981, p. 139).

Ora, os “bons costumes” são parâmetro bastante flexível, dependo da cultura e da época em que se situa. É impensável aplicar tal conceito no Brasil dos anos 2000, para discriminar – no sentido literal da palavra: distinguir, discernir – qual o sujeito que pode ser alvo da posse sexual mediante fraude. Hoje, passados quase 70 anos da redação do artigo, poderá sê-lo qualquer pessoa, homem ou mulher, qualquer que seja a profissão ou status social. Mas, tivemos que esperar 65 anos para que essa anacronismo fosse corrigido, dado o engessamento do sistema legislativo pátrio.

Neste caso, fica bastante evidente como a inflexibilidade do sistema legislativo pode ser suplantada pela interpretação legal.

Segundo o italiano Giuseppe Borre, é essa “má condução” legislativa, a fragmentação do texto legal, e por que a lei não é fruto de uma sociedade homogênea, que se cria uma demanda ao judiciário em solucionar as incertezas criadas pela produção parlamentar. Até porque, segundo o autor, a lei estará sempre em discussão, partindo-se, portanto, sempre de uma dúvida em sua intelecção.[9]

A importância da flexibilização da legislação, no sentido em que indicamos acima, é trazido a tona inclusive nas jurisdições internacionais, conforme ensina Flávia Piovesan:

“Outro relevante princípio é o atinente à interpretação dinâmica e evolutiva da Convenção Europeia, frisando a Corte a necessidade de considerar as mudanças ocorridas nos planos social e político para a adequada interpretação dos direitos nela estabelecidos. Isto é, o alcance e o significado dos direitos não podem restar confinados e estagnados às concepções do momento em que foi elaborada a Convenção. (…) Como observam P. van Dijk e G. J. H. van Hoof: ‘Os parâmetros da Convenção não podem ser considerados estáticos, mas devem refletir as transformações sociais. A interpretação evolutiva demanda sejam consideradas realidades e atitudes contemporâneas e não a situação existente ao tempo em que a Convenção foi elaborada em 1949-1950” (Piovesan, 2007, p. 69-70).

A professora cita, ainda, a título de exemplificação da aplicação do princípio da interpretação dinâmica e evolutiva, julgado da Corte Europeia de Direitos Humanos, que levou em consideração as modificações da sociedade para analisar direitos de crianças nascidas fora da relação de casamento (Case Marckx vs. Blegium, 1979), e de homossexuais (Case Dudgeon vs. UK, 1981).

Assim, a necessidade de suprir o anacronismo legal com a produção jurisprudencial é inegável. Entretanto, essa criação e adaptação das normas pelo magistrado gera uma nova problemática: a dissidência jurisprudencial. Especialmente em um país do tamanho do nosso, cuja jurisdição constitui-se por dezenas de Tribunais de Justiças e Tribunais Regionais Federais, localizados nos estados mais diversos, com populações das mais diversas, as aplicações distintas e não isonômicas da lei é a norma e consequentemente, com as culturas mais diversas. Aí é que se insere a importância, portanto atualíssima, dos mecanismos de uniformização jurisprudencial – no nosso caso, dos recursos extraordinários e súmulas.

Aí que resta evidente a importância dos Tribunais Superiores, uma vez que os tribunais ao redor do país atuam cada vez mais ativamente na correção dos anacronismos legais, e as Cortes Superiores, por sua vez, uniformizam tais entendimentos, garantindo a isonomia no tratamento dos brasileiros perante os atos jurisdicionais.

Assim sendo, pela missão política que possuem, é importantíssimo fixar que os recursos extraordinários, como o próprio nome diz de forma expressa, não são recursos ordinários, que cabem de qualquer julgado que desagrade as partes, sob qualquer fundamento, como são os recursos de fundamentação livre.

Eles possuem uma objetividade jurídica mais relacionada ao ordenamento jurídico como um todo, do que com a causa material relacionada às partes que os interpõe. Por isso, a Constituição elenca de forma taxativa, as hipóteses de cabimento destes recursos, e os pressupostos restritos para seu conhecimento. E por isso são denominados “recursos de fundamentação vinculada”.[10]

Inegável também, ante o todo exposto, que o Supremo e o Superior Tribunal possuem visível função política, de alcance das necessidade da sociedade, em resolver os assuntos mais impactantes em termos de política social.

3. Crise dos Tribunais Superiores – Um panorama

A importância fulcral dos Tribunais Superiores, explicada brevemente no capítulo anterior, hoje é obstada pela crise de eficiência que essas Cortes enfrentam.

O número aviltante de processos que são protocolizados todos os dias no STJ e STF impede que seus Ministros realizem o trabalho e a missão que lhes foi atribuída pela Constituição Federal: uniformizar o Direito pátrio, garantindo a isonomia, afastando os anacronismos legais e implementando políticas sociais.

Para demonstrar rapidamente o que essa crise significa hoje, podemos citar, a título exemplificativo, alguns números relativos ao STJ, obtidos do site do Tribunal e do CNJ.

Desde sua criação em 1988, foram autuados no STJ 3.245.520 processos. No ano de 2000, foram distribuídos 150.738 processos. Esse número passou para 226.440 em 2003, 251.020 em 2006, 313.364 em 2007, 271.521 em 2008, 292.103 em 2009 e 226.981 em 2010.

Os julgamentos realizados em 2010 foram da ordem de 330.283 processos.

Isso significa que no ano passado, cada Ministro do STJ julgou em torno de 10.000 (dez mil) processos. São em média 1.000 (hum mil) processos por mês (considerando o recesso forense de janeiro e julho); 50 (cinquenta) processos por dia.

Isso significa, também, que para cada processo o Ministro poderia dispender apenas 10 minutos.

A decorrência lógica desse cenário é que o estoque do STJ conta hoje com 192.802 processos parados, aguardando julgamento.

Só para se ter uma ideia comparativa, a Suprema Corte dos Estados Unidos recebe, em média, 75 mil processos por ano, dos quais julga apenas 100. Julga-se lá por ano, o que um Ministro do STJ julga a cada dois dias.

Evidentemente que ante tal panorama, exemplificado pelo STJ, mas que aflige igualmente o STF, é impossível que nossas Cortes Superiores realizem suas funções de forma eficaz.

Não se pode analisar com profundidade um processo, abstrair dele uma tese federal e uniformizá-la em 10 minutos.

O resultado desse cenário assustador é um Tribunal abarrotado, atrasado na prestação jurisdicional, e que busca incessantemente frear a entrada dos feitos. É o que veremos a seguir.

4. Jurisprudência defensiva

As causas do congestionamento dos Tribunais Superiores[11] são as mais diversas: falta de estrutura do Poder Judiciário, deficiência de funcionários, má gestão da máquina judicial, litigiosidade excessiva do próprio Estado,[12] excesso de recursos, baixo custo processual para as partes, dentre diversas outras, de cunho tanto administrativo quanto processual.

As soluções a serem buscadas para minimizar os efeitos da crise devem procurar combater todas as suas causas, nas frentes mais diversas possíveis. Entretanto, não é o objetivo deste artigo investigar tais soluções.

Tratamos, neste capítulo, daquelas que foram adotadas de forma emergencial pelos Tribunal Superiores ao decorrer dos anos, no ânimo de barrar a entrada dos processos, e reduzir a demanda por julgamento.

Essas medidas emergenciais, aplicadas de forma verdadeiramente reativa à situação patológica do sistema, também resultaram em julgamentos patológicos, distorcidos, aos quais se dá hoje o nome vulgar de “jurisprudência defensiva”.

A denominada “jurisprudência defensiva” pode ser caracterizada, hoje, como um excesso de rigorismo processual e procedimental. São decisões que se utilizam indiscriminadamente e estendem a aplicação de entendimentos jurisprudenciais, sumulados ou não, que contenham algum óbice ao conhecimento dos recursos.

Se voltam exclusivamente a reduzir o número de processos julgados pelas Cortes Superiores, deixando de entregar uma prestação jurisdicional plena.

Cumpre salientar que os diversos enunciados sumulares e jurisprudência utilizados pela chamada “jurisprudência defensiva” não são em si incorretos. Eles foram criados a partir de exigências legítimas, que finalizam atingir a função pressípua dos recursos extraordinários de uniformização do Direito objetivo. Mas são em larga escala distorcidos nos julgamentos realizados pelos Tribunais Superiores, ou tem sua aplicação alargada para atingir casos aos quais não deveriam ser aplicados.

É o que se poderá verificar em duas situações exemplificativas que analisaremos a seguir.

4.1 Súmula 284 do STF

A primeira situação típica de “jurisprudência defensiva” refere-se à aplicação do enunciado da Súmula 284 do STF.

A referida Súmula afirma, in verbis, que:

“É inadmissível o recurso extraordinário quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.

Compulsando-se os precedentes que deram origem ao enunciado, verifica-se não se tratar de um requisito que diga respeito apenas ao recurso extraordinário, mas a todo e qualquer recurso, e até mesmo à própria petição inicial.

Com efeito, o diploma processual civil estabelece, no art. 295, parágrafo único, II, que a inicial será considerada inepta quando da narração dos fatos não decorrer logicamente o pedido.

Tal exigência deve ser aplicada, indistintamente, a qualquer peça processual, inclusive aos recursos – ordinários ou extraordinários – sob pena de inadmissão dos mesmos. Isso, porque é obrigação daquele que peticiona, discorrer clara e coesamente sobre os fatos e o direito que alega, bem como sobre os pedidos que formula.

A exigência sumulada sob o enunciado 284 do STF é, portanto, coerente com o nosso sistema processual, pois decorre naturalmente do ônus atribuído aos recorrentes de que tragam nas razões recursais uma fundamentação coesiva com o pedido e a natureza do extrordinário, afastando-se as peças de pouca técnica e aquelas com objetivo exclusivamente protelatório.

Contudo, observa-se, diuturnamente, tanto no Supremo quanto no Superior Tribunal, a aplicação indiscriminada da Súmula 284 do STF, com o desígnio particular de obstar o conhecimento dos recursos.

Com efeito, vejamos o julgado a seguir transcrito:

“Processo civil. Agravo de instrumento. (...) Ausência de indicação do artigo violado. Deficiência na fundamentação. Súmula 284 do STF.

(...)

2. A ausência de indicação do dispositivo de lei federal violada revela a deficiência das razões do Recurso especial, fazendo incidir a Súmula 284 do STF: ‘É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia’.

3. Deficiente a fundamentação do recurso, em cujas razões não logra o recorrente demonstrar qual o dispositivo legal violado, não dá ensejo à abertura da instância especial pela alínea a.

4. Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg no Ag 815.186/RJ, 1.ª T., j. 06.03.2007, rel. Min. Luiz Fux, DJ 02.04.2007, p. 246).

No acórdão em comento, o Ministro relator decidiu que: “Verifica-se que a agravante limitou-se indicar a lei federal tida por afrontada, deixando de apontar quais artigos, parágrafos, incisos ou alíneas, conforme o caso, que entendeu malferidos”.

Em outras palavras: não basta que o recorrente indique haver afronta a uma determinada lei federal – conforme exige a Constituição Federal na alínea a do art. 105, III – mesmo que do contexto se compreenda a tese de Direito objetivo envolvida no recurso. De acordo com essa jurisprudência, ele deve apontar expressamente um artigo específico da norma, para que seu recurso possa ser conhecido.

Ainda, segundo a jurisprudência que se formou no entorno da Súmula 284 do STJ, a exigência de discriminar o número do artigo violado é aplicável mesmo quando o recorrente discute a aplicação de uma Lei toda ao invés de outra. Nessas hipóteses, não se trataria de violação a determinado artigo, mas à própria norma, que deixou de ser aposta para a incidência de outra. Por exemplo: aplicação do Código Civil quando se tratar de hipótese de Direito do Consumidor – a violação é do próprio Código de Defesa do Consumidor, em sua inteireza.

Ora, a exigência de “apontar quais artigos, parágrafos, incisos ou alíneas” não está no bojo e na lógica da Súmula 284 do STF. Conforme supraexplicado, esse enunciado volta-se a reafirmar a exigência de fundamentação suficiente no recurso extraordinário. Nada se fala sobre o ônus de discriminar o “artigo, parágrafo, inciso e alínea” da norma federal violada.

Temos, claramente, uma distorção e alargamento da incidência do enunciado jurisprudencial, aplicado em larga escala nos Tribunais Superiores para obstar a apreciação dos recursos.

Essa disformidade no entendimento e aplicação da Súmula do 284 do STF se intensifica ainda mais no julgado a seguir ementado, no qual se exige a indicação do dispositivo tido por violado, mesmo quando o recurso se fundar na alínea c do art. 105, III, da CF/1988 – divergência jurisprudencial.

“Processual civil. (...) Recurso especial fundamentado na alínea c. Não indicação do dispositivo legal ao qual foi dada interpretação divergente. Fundamentação deficiente. Súmula 284 do STF. Prescrição.

(...)

5. A jurisprudência desta Corte é assente no sentido de que a ausência de indicação dos dispositivos em torno dos quais teria havido interpretação divergente por outros Tribunais não autoriza o conhecimento do recurso especial, quando interposto com base na alínea c do permissivo constitucional. Incidência da Súmula 284 do STF.

(...)” (REsp 1274551/RS, 2.ª T., j. 11.10.2011, rel. Min. Humberto Martins, DJe 20.10.2011).

Ora, pode-se facilmente imaginar situações em que determinado tribunal de justiça diverge do entendimento de outro tribunal, ou mesmo do STJ, com relação a uma específica tese de Direito objetivo, sem que a ela esteja vinculada um dispositivo específico de lei. Ou mesmo, que a divergência se dê, exatamente, sobre qual o dispositivo é cabível em determina hipótese fática (e.g. índice aplicável nos expurgos inflacionários).

Cuida-se de uma clara aplicação reativa do entendimento sumular para obstar recursos com base em questíunculas procedimentais: o número expresso do artigo da lei sobre cuja tese divergiram dois tribunais.

A Constituição Federal não faz tal exigência. A Súmula 284 do STF tampouco.

É o predicado da forma sobre a substância, absolutamente avesso à busca contemporânea pela instrumentalidade nas formas, tão bem preconizada nas lições de José Roberto dos Santos Bedaque – que se preocupa em atingir a finalidade do ato e não o ato em si.

4.2 Guia de recolhimento do porte de remessa e retorno no STJ

Outra hipótese bastante típica de “jurisprudência defensiva” ocorre na questão relativa à forma da Guia de recolhimento do porte de remessa e retorno do recurso, largamente aplicada pelos Tribunais Superiores.

Na mesma lógica estabelecida supra, quando análise da Súmula 284 do STF, verifica-se que o problema não reside na exigência da Guia em si. Tal comprovante é de fundamental importância para que se evidencie o pagamento das custas processuais de determinado recurso. Sem ela certamente dar-se-ia espaço à fraude e à não contribuição, gerando consequencias nefastas aos cofres dos Tribunais.

Entretanto, a exigência da Guia, e especialmente de seus requisitos formais, não pode de maneira alguma se sobrepor ao recurso em si.

Por tal motivo, o Código de Processo Civil possibilita, no art. 511, § 2.º, a complementação, no prazo de cinco dias, de custas insuficientes. Isso deve ser entendido, também, como a possibilidade de suprir no prazo legal a falta da Guia, ou eventual deficiência formal no comprovante.

Não é esse, todavia, o entendimento dos Tribunais Superiores, que no intuito de reduzir o número de recurso que tramita em seus gabinetes, aplicam indiscriminadamente uma jurisprudência formalisa e intransigente com relação à Guia de Recolhimento.

Vejamos o seguinte julgado do STJ:

“Processual civil. Agravo regimental no agravo de instrumento. Ausência de traslado de peça essencial. Guia de recolhimento do porte de remessa e retorno. Impossibilidade de se aferir a regularidade do recurso especial. Precedentes.

1. É dever do agravante instruir – e conferir – a petição de agravo com as peças obrigatórias e essenciais ao deslinde da controvérsia.

A falta ou incompletude de qualquer dessas peças, tal como verificado no presente caso, acarreta o não conhecimento do recurso.

2. Na hipótese, o instrumento está deficientemente instruído, porquanto a agravante não juntou aos autos cópia da guia de recolhimento do porte de remessa e retorno e de seu respectivo comprovante de pagamento.

3. Não obstante a ausência de previsão no § 1.º do art. 544 do CPC da exigência de juntada de cópia da guia de recolhimento do porte de remessa e retorno, para a formação do agravo de instrumento, a referida peça é essencial, na medida em que possibilita a aferição da regularidade formal do recurso, a qual está sujeita a duplo controle, nesta instância especial e na ordinária.

4. É importante esclarecer que a decisão ora agravada não reconheceu a deserção do recurso especial, mas apenas entendeu que o agravo de instrumento não havia sido instruído com peças essenciais para a comprovação do efetivo preparo do apelo especial, o que inviabilizava seu conhecimento. Desse modo, não há falar na adoção da providência prevista no art. 511, § 2.º, do CPC, com intimação da parte recorrente para eventual complementação do preparo recursal, porquanto o que se tem, na espécie, é a ausência de traslado de peça essencial nos autos de agravo de instrumento, cujo ônus é da parte agravante, a quem incumbe a fiscalização da formação do instrumento no ato de interposição do recurso.

5. Não se admite, na instância especial, a realização de diligência para suprir falhas quando da interposição do agravo de instrumento, bem como a juntada tardia de peças obrigatórias ou essenciais a sua formação.

6. Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg no Ag 1.118.335/SP, 4.ª T., j. 05.10.2010, rel. Min. Raul Araújo, DJe 19.10.2010).

O relator afirma que:

“Compulsando-se novamente os autos do presente agravo de instrumento, constata-se que a recorrente, de fato, não juntou a guia de recolhimento do porte de remessa e retorno, bem como de seu respectivo comprovante de pagamento.

Como é cediço, é dever do agravante instruir – e conferir – a petição de agravo de instrumento com as peças obrigatórias e essenciais ao deslinde da controvérsia. A falta ou incompletude de qualquer dessas peças, tal como verificado no presente caso, acarreta o não conhecimento do recurso.

Na hipótese em exame, a formação do instrumento encontra-se deficiente, porquanto a ora agravante não juntou aos autos cópia da guia de recolhimento do porte de remessa e retorno, além de seu respectivo comprovante de pagamento, nos termos da exigência prevista na Res. 1/2008, desta Corte, vigente a partir de 27.03.2008.

A respeito do tema, esta E. Corte de Justiça possui orientação firmada no sentido de que, não obstante a ausência de previsão no § 1.º do art. 544 do CPC da exigência de juntada de cópia da guia de recolhimento do preparo do recurso especial, com o respectivo comprovante de pagamento, para a formação do agravo de instrumento, as referidas peças são essenciais, na medida em que possibilitam a aferição da regularidade formal do recurso.

De outro lado, é importante esclarecer que a decisão ora agravada não reconheceu a deserção do recurso especial, mas apenas entendeu que o agravo de instrumento não havia sido instruído com peças essenciais para a comprovação do efetivo preparo do apelo especial, o que inviabiliza seu conhecimento. Desse modo, não há falar na adoção da providência prevista no art. 511, § 2.º, do CPC, com intimação da parte recorrente para eventual complementação do preparo recursal, porquanto o que se tem, na espécie, é a ausência de traslado de peça essencial nos autos de agravo de instrumento, cujo ônus é da parte agravante, a quem incumbe a fiscalização da formação do instrumento no ato de sua interposição.

Por derradeiro, não se admite, na instância especial, a realização de diligência para suprir falhas quando da interposição do agravo de instrumento, bem como a juntada tardia de peças obrigatórias ou essenciais a sua formação.

Nesse sentido:

‘Agravo regimental. Acórdão recorrido. Fundamento constitucional autônomo. Súmula 126 do STJ. Cópia. Recurso extraordinário. Ausência. Preparo. Prova. Ausência. Má-formação. Instrumento. Requisitos. Admissibilidade. Momento. Interposição do recurso. Preclusão.

(...)

3. As cópias que comprovam o preparo do recurso especial (porte de remessa e retorno e custas), Guia de Recolhimento da União – GRU e respectivos pagamentos, são peças essenciais à verificação da regularidade recursal e devem ser juntadas aos autos no momento da interposição do agravo de instrumento. Precedentes.

4. Não se admite a posterior juntada das peças obrigatórias ou das necessárias, imprescindíveis à análise do agravo de instrumento, em virtude da ocorrência da preclusão consumativa. Precedentes.

5. Agravo regimental não provido’” (AgRg no AgRg no AgRg no Ag 1.227.871/MG, 2.ª T., rel. Min. Castro Meira, DJe de 02.06.2010).

É nítido o intento “defensivo” do julgado acima transcrito.

O relator deixa de aplicar dispositivo claro da lei (art. 511, § 2.º, do CPC), que possibilita a complementação das custas insuficientes ou a correção de erro formal na Guia, no prazo de cinco dias, afirmando que tal benefício não se aplica aos apelos extremos.

O afastamento da regra legal não pode se dar ao alvitre do Tribunal, tão somente para impedir o conhecimento do recurso. A intimação para complemetação é uma exigência legal, não podendo o magistrado optar por aplicá-la ou não.

Mais uma vez tem-se a sobreposição do formalismo exagerado sobre mérito e a função do recurso em si, com o objetivo exclusivo de diminuir a quantidade de recursos a serem julgados.

Pior neste caso, pois ao arrepio da Lei.

4.3 Conclusão

A grande problemática da “jurisprudência defensiva” é que ela deturpa entendimentos jurisprudenciais legítimos, como a exigência da fundamentação do recurso ou a comprovação do pagamento das custas processuais, com a finalidade de reduzir o volume de recursos a serem julgados.

O pior é que nem sempre essa finalidade é atingida, o que acaba por gerar como único efeito uma irresignação ainda maior por parte dos jurisdicionados, mais recursos e um maior volume de processos para julgamento.

A característica particular da “jurisprudência defensiva” é que ela não se importa se é possível extrair do contexto recursal a questão federal debatida, e se com isso se uniformizará uma tese de Direito objetivo importante para a sociedade como um todo. Ela fixa-se nas tecnicalidades e no formalismo exagerado, para solucionar os recursos de forma rápida.

Conforme ensina José Carlos Barbosa Moreira:

“A essa luz, o que se espera da lei e de seus aplicadores é um tratamento cuidadoso e equilibrado da matéria, que não imponha sacrifício excessivo a um dos valores em jogo, em homenagem ao outro. Para usar palavras mais claras: negar conhecimento a recurso é atitude correta – e atualmente recomendável – toda vez que esteja clara a ausência de qualquer dos requisitos de admissibilidade. Não devem os tribunais, contudo, exagerar na dose; por exemplo, arvorando em motivos de não conhecimento circunstâncias de que o texto legal não cogita, nem mesmo implicitamente, agravando sem razão consistente exigências por ele feitas, ou apressando-se a interpretar em desfavor do recorrer dúvidas suscetíveis de suprimento. Cumpre ter em mente que da opção entre conhecer ou não conhecer de um recurso podem advir consequências da maior importância prática: por exemplo, se alguém apela da sentença meramente terminativa, o conhecimento da apelação é pressuposto necessário (embora não suficiente) do processamento da atividade cognitiva do tribunal, no sentido de julgar desde logo o mérito, não examinando no primeiro grau de jurisdição (art. 515, § 3.º, acrescentado pela Lei 10.352, de 26.12.2001) – desfecho preferível na medida em que importe, como não raro ocorrerá, a eliminação definitiva do litígio” (Barbosa Moreira, 2007, p. 270).

A “jurisprudência defesiva” é, assim, absolutamente contrária à função essencial dos Tribunais Superiores, e mais do que isso, do próprio processo, que deve servir de meio para a realização da Justiça.

Ademais, ela não resolve a problemática do abarrotamento dos gabinetes, gerando como efeito somente o a má-prestação jurisdicional e o inconformismo das partes.

Nas palavras de Carlos Alberto Carmona:

“Em sede recursal, para focar outros métodos de uniformização de jurisprudência, os problemas foram-se multiplicando ao longo do tempo, pois a divergência na interpretação da lei federal tem destinatário certo, o STJ; este cria tantos entraves para a apreciação dos recursos especiais que o recurso que objetiva a uniformização da interpretação da lei federal mais parece uma miragem, tornando pouco eficaz a promessa constitucional de tornar aquela corte de superposição um fator eficaz de interpretação harmônica do direito federal” (Carmona apud Parente, 2006, p. IX).

5. Repercussão geral como uma possível solução – Também no recurso especial

A inadequação da “jurisprudência defesiva”, e necessidade de afastamento dessa solução incoerente, não significa que a problemática fica resolvida.

A função dos Tribunais Superiores não é atingida sem se que encontre uma solução, ou ao menos uma atenuação, para a crise de eficiência lá instalada.

Por tal motivo, analisaremos brevemente neste capítulo um mecanismo adotado pelo Supremo Tribunal Federal, que pode significar uma redução significativa no número de processos que tramita nos Tribunais Superiores,[13] de forma constitucional: a repercussão geral.

5.1 Origens da repercussão geral

Com vistas a reduzir o número de processos que tramitam no STF, e a consequente impossibilidade de se atingir a finalidade do recurso extraordinário com a crise que se instalou nos Tribunais Superiores, a EC 45/2004, inseriu no art. 102 da CF/1988 um novo requisito de admissibilidade ao recurso extraordinário (stricto senso): a repercussão geral.

O art. 102, § 3.º, da CF/1988 dispõe que: “No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros”.

Com a adoção da repercussão geral, o Supremo passa a ter o poder discricionário de dizer aquilo que repercute, que interessa à toda a socidade, e que portanto merece ser analisado por aquela Corte. Ou seja, o STF pode, a partir de 2004, escolher os recursos que quer julgar.

Essa alteração renova de forma drástica o papel da Corte Constitucional do país, assim como aconteceu com a Suprema Corte americana nas reformas de 1891 e 1988. O STF passa a ter, com a discricionariedade da repercussão geral, um papel muito mais político do que judicializante.

O Supremo tem o poder, com a adoção do filtro, de centrar seus esforços naqueles casos que dizem respeito a relevantes questões sociais e políticas – como vem acontecendo, por exemplo, com a questão da união estável homoafetiva, Lei da Ficha Limpa, dentre outros.

Corroboram com essa visão José Miguel Garcia Medina, Teresa Arruda Alvim Wambier e Luiz Rodrigues Wambier:

“Entende-se, com razão, que, dessa forma, a Suprema Corte será reconduzida à sua verdadeira função, que é a de zelar pelo direito objetivo – sua eficácia, sua inteireza e a uniformidade de sua interpretação – na medida em que os temas trazidos à discussão tenham relevância para a Nação” (Medina; Wambier; Arruda Alvim Wambier, 2005, p. 374).

É evidente a semelhança entre o filtro instalado pela repercussão geral e aquele da experiência americana, denominado writ of certiorari, que, diga-se, foi criado em 1891 com os mesmos propósitos daquele introduzido pela EC 45/2004: reduzir o volume de processos analisados pela Corte Suprema.

Senão vejamos:

O termo certiorari deriva do latim certiorare, que significa mostrar, provar. No instrumento americano, o certiorari significa que o recorrente deve demonstrar, comprovar que o seu pleito interessa à sociedade americana, a ponto de ser analisado pela Suprema Corte.

Portanto, conceder o certiorari significa ter acesso à Suprema Corte, poder discutir sua demanda perante o mais alto tribunal do país.

O rito para o recurso à Suprema Corte norte americana inicia-se com o writ. O recorrente deve peticionar alegando a relevância – a repercussão geral – do tema para o país, explicitando porque seu recurso é digno de conhecimento. Se essa petição de interposição for aceita, e o deve ser pela chamada rule of four, ou seja, quatro dos nove ministros (Justices) – 2/3 dos membros da Suprema Corte –, então o próprio Tribunal enviará ao tribunal de origem ordem mandando subir os autos para exame.

Portanto, ter êxito na petição de certiorari não significa o provimento do recurso em si. Ele só garante ao recorrente a possibilidade de ser ouvido pela Corte Suprema no mérito de sua irresignação.

De acordo com Robert Stern, por meio do certiorari somente sobrevivem na Supreme Court aqueles que o Tribunal entender “sufficiently important or meritorious to warrant further review” (Stern, 1986, p. 54).

O filtro do certiorari foi muito eficiente no seu propósito. Hoje, somente cerca de 1,3% das petições são concedidas, o que reduziu o número de 75 mil (número médio de writs ajuizados) para 100 processos ao ano (Stern, 1986, p. 55).

Frise-se que o motivo de denegação dos writs não está vinculado a razões formais ou processuais.[14] O ministro da Suprema Corte, Justice Harlan, explica que “the question of whether a case is ‘certworth’ is more a matter of ‘feel’ than of precisely ascertainable rules” (Harlan, citado por Stern, 1986, p. 222). Ou seja, o poder de discricionariedade da Corte é tamanha a permitir que a decisão de aceitabilidade do writ seja guiada pelo sentimento de seus julgadores no sentido do recurso ser cabível e relevante o suficiente para merecer julgamento.

Evidentemente que o filtro do certiorari está sujeito a diversas críticas por parte da doutrina norte americana. A censura mais importante se centra no fato de que a Suprema Corte muitas vezes fecha os olhos para casos que teriam importância fulcral para o país, por não dar a atenção necessária ao writ of certiorari, deixando as petições serem analisados exclusivamente pelos assessores (clerks).[15] Critica-se, ademais, a pouca transparência com que os writs são analisados, resultado de decisões denegatórias que não trazem a motivação devida e não são publicadas.[16]

Além disso, critica-se o filtro de admissibilidade do recurso à Suprema Corte por se observar que massiva maioria de casos aceitos não diz respeito efetivamente à Constituição, mas a matérias relativas a economia, política, e a administração da Justiça. Isso significaria desviar a Supreme Court de sua função primordial, que é resguardar a Carta Maior.

No Brasil, a repercussão geral não é alegada em petição de interposição do recurso, conforme o é nos Estados Unidos. O filtro deve ser analisado em preliminar de recuso extraordinário – o que em tese não altera significativamente o rito em comparação com o que acontece na américa do norte, porquanto a não concessão da repercussão geral impede o conhecimento do restante do recurso, por ser preliminar, condição de admissibilidade.

Na repercussão geral é analisada a importância da tese constitucional discutida no recurso para a sociedade. Ou seja, avalia-se se aquele recurso específico, que diz respeito às partes que nele figuram, pode ter um impacto significativo à sociedade, a ponto de justificar a movimentação da Corte Suprema.

Se o filtro da repercussão for ultrapassado, então analisar-se-á os outros requisitos de admissibilidade, prequestionamento e esgotamento de instância, para então se julgar o mérito da questão.

Como consequência inarredável, os recursos extraordinários julgados, e que portanto possuem a chamada repercussão geral, tem seus efeitos estendidos à toda a sociedade, erga omnes. Não poderia ser diferente, afinal a aceitabilidade do recurso está assentada exatamente na possibilidade de se transpor a matéria analisada no caso concreto à sociedade como um todo.

Sobre o tema, Teresa Arruda Alvim Wambier afirma que:

“Vejo com bons olhos a reintrodução no ordenamento jurídico brasileiro, mais especificamente no sistema recursal, da figura da repercussão geral. Trata-se indubitavelmente de figura que tende a reconduzir o STF à sua verdadeira função, que é a de proferir decisões sobre o direito objetivo – no que diz respeito à sua eficácia, à sua inteireza e à uniformidade de sua interpretação – em matéria constitucional, quando os temas trazidos à discussão tenham relevância para a Nação.

Espera-se que a introdução desta figura no ordenamento jurídico brasileiro tenha como efeito diminuir a carga de trabalho do STF, fazendo com que este órgão de cúpula do nosso Poder Judiciário passe a gerar acórdãos de melhor qualidade, jurisprudência mais visível e realmente paradigmática. Está-se vivendo um momento em que muitos Tribunais se encontram verdadeiramente abarrotados de recursos, o que os leva, compreensivelmente, a adotar medidas extremas para diminuir a sua carga de trabalho. Quando a adoção destas medidas extremas passa a se traduzir no rigor excessivo e às vezes até indevido no que diz respeito à verificação da presença dos requisitos formais, relativos à admissibilidade dos recursos, passa-se a querer, e este é o meu caso, que haja sistemas de filtro, que acabem levando a uma efetiva diminuição da carga de trabalho nos Tribunais, mas cujos critérios sejam legítimos. No meu entender, este é o caso da repercussão geral.

(…)

Pode-se pensar que uma questão seja relevante do ponto de vista estritamente jurídico, quando está em jogo um conceito de um instituto básico do direito como, por exemplo, o direito adquirido; haverá relevância social, apta a ensejar o julgamento do recurso extraordinário, quando se tratar, por exemplo, de ações que versem sobre moradia, escola, e mesmo sobre a legitimidade do Ministério Público para intentar estas ações; relevância econômica haverá, numa ação em que se discuta sobre a privatização de serviços públicos essenciais; e relevância política se encontrará, quando a causa, em que tenha nascido a pretensão recursal extraordinária, deva gerar uma decisão capaz de repercutir em relações internacionais” (Arruda Alvim Wambier, 2007, p. 368-369).

Como bem colocado pela professora, a repercussão geral tem o poder de reduzir drasticamente o número de processos que tramitam no STF. Isso deve significar que os ministros terão tempo para analisar com cautela aqueles casos que entendem mais importantes para o Brasil como um todo.

Evidentemente que o instrumento está sujeito a críticas. Aqui, o nosso intento não é de analisar minusciosamente as particularidades da repercussão e tampouco de avaliar as críticas da doutrina. Entretanto, é importante frisar que o STF deve observar as críticas que são feitas ao writ of certiorari americano – já que instrumento que baseou a criação da repercussão geral – para não incidir nos mesmos erros.

Isso significa que o Supremo deve dar a importância devida às alegações de repercussão, analisando cautelosamente o interesse do país no mérito do recurso. A preliminar não pode ser relegada a uma avaliação superficial e descuidada, sob pena de tornarmos o instrumento um fardo ao invés de uma solução.

Ademais, as decisões de denegação da repercussão geral devem ser sempre motivadas e públicas. Nesse sentido, José Rogério Cruz e Tucci afirma que:

“Considerando, no entanto, as regras dos incs. IX e X do art. 93 da CF/1988 em vigor, torna-se despicienda, a rigor, qualquer consideração a respeito de tal ponto de vista, até porque, como bem pondera Barbosa Moreira, especialmente o pronunciamento final, a derradeira palavra a respeito de um litígio, “exatamente porque se destina a prevalecer em definitivo, e nesse sentido representa (ou deve representar) a expressão máxima de garantia precisa, mais do que qualquer outro, mostrar-se apto a corresponder à função delicadíssima que lhe toca. Não é admissível que a garantia se esvazie, se despoje de eficácia no momento culminante do processo mediante o qual é chamado a atuar” (Cruz e Tucci, 2008, p. 437).

5.2 Aplicação da repercussão geral ao recurso especial

Os benefícios da repercussão geral, acima analisados, são inconfundíveis. Com ele é possível que o Tribunal analise somente as questões realmente de relevância para o país, e exerça de fato a função que lhe foi atribuída pela Constituição Federal: zelar pelo Direito objetivo pátrio.

Nesse sentido, Carlos Alberto Carmona afirma que:

“Como disse acima, a ideia de subordinar o conhecimento do recurso à repercussão geral da questão discutida está dentro da perspectiva de trabalho de uma corte constitucional (ou de uma corte que tenha por principal objetivo a uniformização da interpretação e aplicação de leis em regimes federativos ou unitários). O método, porém, é fundamental. Aí está a pedra do novo sistema, que revitaliza velhas ideias: a técnica permite ao STF escolher as causas que pretende julgar em grau extraordinário segundo critérios de relevância (em relação a outros processos) das questões constitucionais discutidas encontra respaldo no escopo educativo do processo, pois a formação de precedentes jurisprudenciais afeta naturalmente o comportamento daqueles que vivem sob a orientação de determinado ordenamento jurídico. Assim, a interpretação da Constituição (bem como de todas as leis) tem função social importantíssima, o que justifica que a Suprema Corte queira interferir apenas na formação de precedentes de alguma importância, já que nosso sistema superposto (e hipertrofiado) de recurso mostra que a justiça da decisão é matéria com que se preocupam os juízos de primeiro grau e as cortes locais, não as cortes de superposição” (Carmona apud Braghittoni, 2007, p. X – grifo nosso).

Assim, não é compreensível o motivo de o legislador da EC 45/2004 não ter atribuído o filtro da repercussão geral também ao STJ.

Ora, conforme dito alhures, o STJ é uma derivação do Supremo. Ele foi criado a partir de competências que antes pertenciam ao STF. Exerce função absolutamente semelhante a da Corte Constitucional. Não há, assim, motivo para que um filtro da importância da repercussão geral não seja aplicado também ao recurso especial.

Hoje, analisando-se a Constituição Federal, verifica-se uma verdadeira contradição entre os textos dos arts. 102 e 105. Isso, porque os requisitos de admissibilidade do recurso especial e extraordinário são todos bastante semelhantes, o que aponta para a identidade de propósito desses dois recursos. Entretanto, hoje o extraordinário possui o filtro da “repercussão geral”, a mais do que o recurso especial.

Segundo José Rogério Cruz e Tucci:

“Forçoso é reconhecer que, paradoxalmente, haverá também questões de índole constitucional ‘menos importantes’ para os fins do recurso extraordinário, porque despidas de repercussão geral.

Sob esse aspecto, é realmente surpreendente ‘que tenha entendido o legislador constitucional deverem-se distinguir questões relevantes das não relevantes, no plano do direito constitucional e não no plano da lei federal, como se tudo o que constasse da lei federal fosse relevante’. Sim, porque a novidade ora instituída concerne apenas à admissibilidade do recurso extraordinário (...)” (Cruz e Tucci, 2008, p. 433).

E também Teresa Arruda Alvim Wambier:

“Lamenta-se que não tenha sido adotado também para selecionarem-se os recursos especiais que vão para o STJ. O fato de só haver repercussão geral para os recursos extraordinários reflete, de certo modo, uma incongruência, já que se poderia pensar que no que diz respeito a problemas ligados a Constituição Federal, deveriam ser selecionadas questões relevantes. Mas, paradoxalmente, se entenderia que todas as questões que envolvem ofensa a Lei Federal seriam relevantes a ponto de justificar ou de ensejar o julgamento dos recursos especiais” (Arruda Alvim Wambier, 2007, p. 368).

Ora, conforme se demonstrou acima, o STJ sofre inegavelmente com uma crise de eficiência causada pelo aviltante número de processos que lá ingressam todos os dias. Evidentemante, sua função precípua de defensor da legislação federal infraconstitucional e uniformizador de jurisprudência é severamente obstada pelo volume de recursos lá existentes.

O STJ encontra-se exatamente na mesma situação do Supremo, antes da criação da repercussão geral, e da Supreme Court dos Estados Unidos, antes do writ of certeriori.

Também como demonstrado, a função do STJ, com relação ao recurso extraordinário, é a mesma do STF: uniformizar a jurisprudência e resguardar o Direito objetivo. A única diferença é a natureza das normas às quais cabe a cada Tribunal resguardar.

Assim sendo, não há razões para deixar de aplicar o requisito da repercussão geral também ao recurso especial.

A inserção desse filtro provalvelmente significará um Tribunal mais eficiente e que aplique menos a tão criticada “jurisprudencia defensiva”, até porque a sua solução imediata terá sido substituída por um requisito constitucional, muito mais eficaz na redução do número dos processos e principalmente na qualitativização dos julgamento.

6. Conclusão

Os Tribunais Superiores do país, STJ e STF, sofrem com uma drástica crise de eficiência, gerada pelo acúmulo dos processos em seus gabinetes.

O volume de recursos especiais que são protocolizados a cada ano no STJ somam em torno de 300 mil, o que significa uma média de 10.000 processos por ano para cada Ministro. Isso corresponde a 1.000 processos por mês; cerca de 50 julgamentos no dia; 1 processo a cada 10 minutos.

Esse panorama caótico dos Tribunal Superiores os impede de alcançar sua função constitucionalmente atribuída: uniformizar o entendimento do Direito objetivo pátrio, garantindo a aplicação isonômica da norma e afastando os anacronismos legais.

Os Tribunais Superiores não conseguem realizar adequadamente a sua missão, de igualar a aplicação da Lei em todo o território nacional, pacificando divergências e incongruências no sistema, porque o volume de processos a serem analisados todos os dias não os permite. Em palavras mais claras: não há tempo hábil para se analisar uma questão com profundidade a ponto de proferir uma decisão com a robustez que se espera de uma Corte Superior.

Ante tal cenário, utiliza-se nos Tribunais Superiores o que se apelidou vulgarmente de “jurisprudência defensiva”.

Conforme se demonstrou neste artigo, a “jurisprudência defensiva” é uma forma de barrar a entrada dos processos pela aplicação rígida e muitas vezes distorcida de entendimento jurisprudencial e súmulas que contenham óbices processuais ao conhecimento dos recursos.

Para tanto, alarga-se a aplicação de súmulas e jurisprudência a casos muitas vezes não cabíveis, apenas para obstar seu conhecimento. Concretiza-se, assim, julgamentos restritos aos preciosismos procedimentais e processuais, como, por exemplo, a necessidade de se explicitar o número do artigo da norma que se alega violação (Súmula 284 do STF) ou impedir a concessão de prazo para complementação das custas processuais (art. 511, § 2.º, do CPC).

A solução patológica da “jurisprudência defensiva” vem como verdadeiro escudo à avalanche de processos que ingressa nos Tribunais Superiores todos os dias, e que se acumula mês a mês. É a resposta jurisprudencial incorreta a um problema que mereceria uma solução legislativa coerente – quiçá constitucional.

Essa solução pode ser vislumbrada, talvez, na repercussão geral. Instituto inspirado na experiência americana do writ of certiorari, que criou, com a EC 45/2004, um novo requisito de admissibilidade para o recurso extraordinário stricto senso.

A repercussão geral é um filtro de admissibilidade do recurso extraordinário, que exige ao recorrente a demonstração da importância da questão para a sociedade como um todo. Ele impede que o Supremo seja importunado com análise de questões casuísticas, “brigas de vizinhos”, que nada interessam à coletividade.

Por meio do filtro da repercussão geral é possível que o Supremo escolha os casos que entender relevantes para o Brasil, e que por isso merecem ser discutidos pela mais alta Corte do país. Trata-se de uma opção constitucional que tudo tem a ver com aquilo que se idealiza para os Tribunais Superiores – que eles, atuando como cortes extraordinárias, restrinjam seus esforços a casos de relevante repercussão para todo o ordenamento pátrio.

Com a repercussão geral, viu-se o número de processos do STF diminuir de 110 mil para cerca de 30 mil julgamentos por ano – uma redução significativa. Entretanto, o filtro constitucional somente foi criado pelo legislador para atender ao recurso extraordinário, deixando outro Tribunal Superior de mesma hierarquia, o STJ, na condição em que se encontrava o Supremo antes da EC 45/2004.

Não se vislumbra razões para que a repercussão não seja atribuível também ao STJ. Afinal, sua incidência poderia significar o afastamento, ou ao menos o abrandamento da “jurisprudência defensiva”, porquanto o próprio legislador teria dado uma solução legítima para a problemática da crise de eficiência.

Dessa forma, entendemos indispensável a emenda também ao art. 105 da CF/1988, para que se faça necessária a demonstração da repercussão geral no recurso especial. Trata-se de uma solução legítima à crise do STJ, alternativa à criação jurisprudencial dos julgamentos “defensivo”, e que possibilitará o atingimento da função precípua dos nossos Tribunais Superiores.

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Pesquisas do Editorial

Veja também Doutrina

• A exigência da preliminar de repercussão geral em apartado, Flávia Pereira Ribeiro – RePro 187/239;

• Duas providências do projeto de novo Código de Processo Civil para o fim da chamada jurisprudência defensiva uma evolução rumo ao pleno acesso à Justiça, de André Luís Monteiro – RePro 204/263;

• Jurisprudência defensiva de segunda geração, de Paulo Camargo Tedesco – RePro 182/259; e

• O formalismo exacerbado quanto ao preenchimento de guias de preparo ainda a jurisprudência defensiva dos Tribunais Superiores, de Márcio Carvalho Faria – RePro 193/231.

[1] “O STJ foi instituído no Brasil em momento de grande desproporção entre a solicitação de serviços e a capacidade de trabalho do STF. Eram mais de 20 Estados com seus Tribunais de Justiça e alguns de Alçada, mais o Tribunal Federal de Recursos, mais os tribunais das Justiças Especiais da União, alimentando o Supremo com causas que ali iam ter pela via do recurso extraordinário e agravos de instrumento (afora a competência originária e casos de recursos ordinários). A mais alta Corte do País, então como único órgão de superposição, era manifestamente insuficiente para acolher tanta solicitação. O Poder Judiciário não dispunha de meios materiais ou políticos para fazer coisa alguma em atendimento à grita, que era grande no mundo jurídico. Naquele contexto, o sistema regimental de admissibilidade de recursos extraordinários fundados nas antigas letras a e c era inevitavelmente restritivo, somando-se a pesados óbices postos por via pretoriana, como o da razoabilidade da interpretação da lei federal (Súmula 400 do STF).

A insatisfação então generalizada careceria de legitimidade, caso tivesse razão aquela parte da doutrina que viera sustentando a missão puramente político-jurídica do recurso extraordinário, apontado como instrumento destinado apenas à preservação da ordem jurídica federal em sua autoridade e unidade sem qualquer implicação ética ou social com o valor do justo. Se o recurso extraordinário tivesse somente aquele escopo institucional e não se inserisse no contexto legitimador dos recursos em geral, talvez inexistisse fundamento sério para dar ouvidos às críticas então endereçadas ao sistema. A colocação do problema seria de incensurável coerência lógica, uma vez que todo o conjunto de óbices postos à admissibilidade do recurso extraordinário atingia somente casos em que o seu julgamento pelo Supremo Tribunal não seria apto a projetar qualquer influência sobre a ordem jurídica federal” (Dinamarco, Cândido Rangel. Superior Tribunal de Justiça e acesso a ordem jurídica justa. RePro 59/14.).

[2] “Há ainda outra razão, até mais séria do que as anteriores: como dito, nosso STF foi inspirado na Suprema Corte americana. ‘Inspirado’, aliás, chega a ser um eufemismo, tão direta que foi a ‘transposição’ do sistema entre lá e cá. E, na mesma medida, nosso recurso extraordinário é copia quase fiel do recurso que lá existe, como já visto também.

Assim, revela-se para o Brasil de enorme importância tal comparação, até para avaliar se poderia ser aqui utilizada alguma sistemática de ‘filtro qualitativo’, que, curiosamente, não trouxemos nem quando da criação do Supremo, nem quando da instituição do recurso extraordinário” (Braghittoni, Rogério Ives. Recurso extraordinário: uma análise do acesso do Supremo Tribunal Federal. São Paulo: Atlas, 2007. p. 16).

[3] “Com a industrialização dos Estados Unidos, o número de apelações que deviam ser apreciadas obrigatoriamente (mandatory appeals) pela Suprema Corte aumentou muito. Com isso, teve-se de alterar em 1891 a Lei Orgânica do Judiciário Federal (1789 Judiciary Act). Foram, como se antecipou, criados os ‘Circuits’, ou seja, os tribunais regionais federais (U.S. Courts of Appeals), que passaram a atuar como tribunais intermediários em relação à Suprema Corte e à primeira instância federal. Introduziu-se, mais, na jurisdição recursal, o instituto do Writ of Certiorari, de raízes do common law. Algumas apelações continuaram de conhecimento obrigatório (mandatory); outras, porém, só por meio de petition for writ of certiorari. A pauta da Suprema Corte tornou-se mais uma vez compatível. (...)

Após a 1.ª Guerra Mundial, a caseload da Suprema Corte ficou novamente abarrotada, insuportável. (...) Em 1925, depois de muito lobby, o Congresso cedeu e alterou o power da Suprema Corte. Por outras palavras, as apelações de conhecimento obrigatório (mandatory appeals) diminuíram e, em compensação, cresceu o número de petitions for writ of certiorari.”(...)

Em 1988, o Congresso alterou mais uma vez a lei orgânica da magistratura: as mandatory appeals na prática desapareceram. Em outras palavras, o acesso recursal hoje só mesmo por intermédio da petition for writ of certiorari” (Maciel, Adhemar Ferreira. Restrição à admissibilidade de recursos na Suprema Corte dos Estados Unidos e no Supremo Tribunal Federal do Brasil. In: Fabrício, Adroaldo Furtado. Meios de impugnação ao julgamento civil – Estudos em homenagem a José Carlos Barbosa Moreira. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 35-36).

[4] The Constitution assigned the Supreme Court with jurisdiction over “all cases, in law and Equity, arising under this Constitution, the laws of the United States, and treaties made, or which shall be made under their Authority.” 33 The jurisdiction of the Supreme Court was only partially determined by the Constitution and it is divided into original and appellate. Article III, section 2, determines the cases “over which the Court has either appellate or original jurisdiction”, making it clear that the “conferral of such appellate jurisdiction is subject” to Congress's regulation. 34 Original cases are directly submitted to the Supreme Court without being previously examined by any lower court while appellate cases are directed to the Supreme Court after having been examined by lower courts (Pinto, Valentina Mello Ferreira. A comparison between the writ of certiorari in the Inited States and extraordinary appeal’s general repercussion requisite in Brazil. RePro 187/113).

[5] “As liberdades civis compreendem, longe, o maior campo das atividades da Corte, mas não dominam inteiramente a pauta da Corte. Cerca da metade dos casos cai em outros campos de políticas. Estes outros casos, como os casos referente às liberdades civil, surgem, em geral, de políticas do Governo. No entanto, costumam envolver questões de interpretação de leis em vez de questões constitucionais que predominam nos casos de liberdades civis” (Baum, Lawrence. A Suprema Corte americana. Trad. Élcio Cerqueira. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987. p. 247).

[6] Discussão relevante que se trava a respeito de tal questão é a distinção, e separação, entre o julgamento da questão de direito e matéria de fato. A importância reside em determinar se é possível julgar questões fáticas nos recurso extraordinários, e em que medida se pode fazê-lo. A este respeito, veja-se os comentários de Teresa Arruda Alvim Wambier: “É conhecida a dificuldade existente em separarem-se questões de fato das questões de direito.

A preocupação com a distinção entre questão de fato e questão de direito não é nova.

Apesar dos esforços da doutrina, não raro referida distinção não é feita de maneira clara e precisa, mas, ao contrário, em muitos casos, a questão de fato se confunde com a questão de direito.

Tem-se dito, com acerto, que, rigorosamente, seria impossível fazer-se esta distinção, pelo menos no plano ontológico, já que o fenômeno direito ocorre, de fato, no momento de incidência da norma, no mundo real, no universo empírico.

A resolução das questões ocorre por meio de decisões que são proferidas depois do que se pode ver como um movimento “pendular”, que se dá entre o mundo dos fatos e o das normas, até que o aplicador da lei consiga enxergar com clareza a subsunção, qualificando os fatos e determinando-lhes as consequências no plano normativo.

Mas, paralelamente ao raciocínio antes desenvolvido, o que se pode dizer é que, se de um lado, o fenômeno jurídico envolve necessariamente fato/direito, a nosso ver pode-se falar em questões que sejam predominantemente de fato e predominantemente de direito. Ou seja, o fenômeno jurídico é de fato e é de direito, mas o problema (= a questão) pode estar girando em torno do aspecto fático ou em torno do aspecto jurídico. Queremos com isso dizer que, embora indubitavelmente o fenômeno jurídico não ocorra senão diante de fato e de norma, o aspecto problemático desse fenômeno pode estar lá ou cá. E então se dirá que a questão é de fato ou de direito.

Ainda, a possibilidade de se subdividirem as questões jurídicas em questões predominantemente fáticas e questões predominantemente de direito pode nascer de dois critérios diferentes.

O primeiro deles é o ontológico ou substancial, que diz respeito à natureza mesma, ao ‘ser’ dessas questões. O segundo é de natureza técnico-processual e não se pode dizer que, a partir de uma visão pragmática do direito, seja menos importante que o outro.

Segundo este último critério (técnico processual), classificam-se as questões em fáticas e jurídicas, para efeito de possibilidade de reexame por meio de remédios de estrito direito, a partir do mecanismo processual por meio do qual deve operar-se este reexame. Neste grupo, se encontra justamente o recurso especial.

De um modo geral, os autores ligados à filosofia do direito vêm notando que os problemas de interpretação da norma e de subsunção estão intimamente ligados e que ‘há razões de tipo processual, ligadas à distinção entre questão de fato e questão de direito, para estudar-se aquela distinção’. Tem-se percebido, assim, que a distinção entre questão de fato e questão de direito tem uma dimensão ligada às formas de impugnação dos atos do juiz” (Recurso especial e ações de família. RePro 176/36).

[7] “Objeto do recurso não são nunca os fundamentos da decisão recorrida. Nem são eles que transitam em julgado. O de que se recorre e o que transita em julgado é a conclusão da sentença e não os motivos em que se assenta (art. 469-I do CPC).

Não fora isto, a parte vencedora mais inconformada com os fundamentos adotados pela decisão, que, a seu juízo, não seriam os melhores, ou que de algum modo poderiam vir a causar-lhe embaraço econômico ou moral, poderia recorrer para que a sentença fosse mantida por outros motivos; o que, qualquer um sabe, seria um rematado absurdo.

Particularmente, não se deve confundir o objeto do recurso com as questões que condicionam a sua admissibilidade. Exemplificando, os recursos contra decisões de mérito, como o recurso extraordinário, o recurso especial e os embargos infringentes ou infraconstitucional, ou de divergência entre votos, mas sim, visam à produção de um novo juízo de mérito sobre a causa. Diferente seria se os nossos recursos obedecessem à técnica da cassação francesa: decide a Corte de Cassação a questão que deu origem ao recurso, mas não a causa, que deverá ser decidida sempre por outro tribunal, que tomará como premissa de sua decisão o acórdão proferido pela Corte de Cassação. Como se sabe, não é este o nosso sistema” (Botelho de Mesquita, José Ignacio. Recurso extraordinário e recurso especial: contrastes e confrontos. In: Fabrício, Adroaldo Furtado. Meios de impugnação ao julgado civil – Estudo em homenagem a José Carlos Barbosa Moreira. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. vol. 5, p. 360).

[8] Obviamente que essa característica e função marcantes das Cortes Supremas não se restringe aos Estados Unidos da América, e muito menos aos países da América Latina. Neil Andrews, relatando a experiência da Suprema Corte do Reino Unido afirma que: “Em 1934, o acesso à House of Lords deixou de ser direito da parte. Em vez disso, o recorrente passou a precisar de uma permissão para interpor o recurso final, obtida ou no juízo a quo ou na própria House of Lords” (Andrews, Neil. A Suprema Corte do Reino Unido: reflexões sobre o papel da mais alta corte britânica. RePro 186/299).

Andrea Proto Pisani, por sua vez: “Si può puntare sul modello delle corti supreme di tipo anflossassone o anche solo tedesca. In tal caso occorre esplicitamente affermare che la Corte di cassazione decide solo i ricorsi Che presentano questioni di rilievo generale, nonché – stante la funzione instituzionale di assicurare non solo l’esattezza ma ache l’uniformità della giurisprudenza allo scopo di garantire Il valore costituzionale della eguaglianza davani alla legge – i ricorsi avverso sentenza che abbiamo disatteso (consapevolmente o no, con ampla motivazione di dissenso o no) i precedenti enunciati dalla corte” (Pisani, 2008, p. 264).

[9] “Appartiene alla relatività storica il modo d’essere del rapporto (intellettuale, culturale, epistemologico) fra il guidice e la legge, e per molti aspetti il modo stesso di essere della legge. Non solo per la frammentazione dei testi, ma per la sovrabbondanza e la cattiva tecnica redazionale delle leggi, per il fenomeno della ‘decodificazione’, per le non rare ipotesi di sviamento di potere legislativo, per gli inediti problemi di gerarchia fra fonti del diritto, ma anche, e di più, perchè la legge non è frutto di una società omogenea e quindi rimanda al giudiziario incertezze non composte in sede parlamentare, e, ancora, perchè la legge stessa è sempre, potenzialmente, in discussione, non è punto di arrivo ma doveroso punto di partenza di un dubbio” (Borrè, Giuseppe. La Corte di Cassazione Oggi. In: Bessone, Mario. Diritto giurisprudenziale. Turim: Giappichelli Editore, 1996. p. 161).

[10] “Isto significa que não basta à parte noticiar no seu recurso ter obtido uma decisão mais desfavorável do que a que almejava, mas antes lhe cumpre demonstrar que o ato impugnado tornou-se-lhe gravoso pelo fato de ter infringido a ordem positivo-constitucional” (Fux, Luiz. A reforma do processo civil. 2. ed. rev., atual. e ampl. Niterói: Impetus, 2008. p. 286).

[11] Do total de julgados no STJ em 2010 (330.283 processos), a 21,32% foi dado provimento, a 60,11%, negado, 13,98% não foram conhecidos e 4,59% encontram-se na categoria “outros” (homologação de desistência/acordo, decisões proferidas em conflitos de competência, entre outras decisões).

Frise-se que desse total (330.283), 69.797 referem-se a Recurso Especial (a 39,37% foi dado provimento, a 48,01%, negado, 6,31% não foram conhecidos e 6,31% incluem-se na categoria “outros”), e 131.379 correspondem a Agravo de Instrumento (a 14,77% foi dado provimento, a 57,65%, negado, 25,18% não foram conhecidos e 2,40% incluem-se na categoria “outros”) [http://s.conjur.com.br/dl/relatorio-estatistica-stj-2010.pdf].

[12] Um estudo realizado pela FGV-RJ mostrou que o setor público é a origem de 90% de todos os processos em tramitação na Suprema Corte, e o Poder Executivo Federal é o maior usuário, com 68% dos processos. Dentre os 12 maiores litigantes, a única empresa privada é a Telemar. Só a Caixa Econômica Federal, União e INSS correspondem a 50% dos processos. Os pesquisadores destacam também que Caixa Econômica, Banco Central e Telemar possuem uma taxa de litigância ativa de quase 100%, ou seja, chegam ao Supremo para tentar reformar decisões de tribunais inferiores. Os processos recursais dominam o STF, mas poucos atores são os responsáveis por eles. Apenas 10 litigantes respondem por quase 65% deles e entre os 10 maiores, 9 são ligados ao Poder Executivo (fonte: [www.conjur.com.br/2011-mai-04/estudo-mostra-stf-corte-recursal-uniao-maior-usuario]).

[13] “A súmula vinculante e a repercussão geral garantiram que o STF revertesse o crescimento constante de processos recursais. Em apenas três anos, de 2007 a 2010, o total de processos caiu de mais de 110 mil ao ano para cerca de 30 mil” (fonte: [www.conjur.com.br/2011-mai-04/estudo-mostra-stf-corte-recursal-uniao-maior-usuario]).

[14] Embora não haja requisitos formais para concessão do writ of certiorari e admissão do recurso, questões que são mais facilmente aceitas envolvem dez matérias – “Rule of 10 dispositions”.

“Rule 10 “rearranges the certiorari considerations into three basic categories. The first deals with ‘decision of federal court of appeals (i) that conflict with decisions of other sister courts (...), or (ii) that decide ‘important' federal questions’ in a way that conflicts with a decision by a state court of last resort,’ or (iii) that in some other way calls for the exercise of the court's supervisory power.’ The second category includes ‘decisions of state courts of last resort that have decided ‘important’ federal questions ‘in a way that conflicts with the decision of another state court of last resort or of a United States court of appeals’. “Finally the third category deals with ‘decisions of either state courts or federal courts of appeal on ‘important’ questions of federal law that (i) have not been, but should be, decided by the Supreme Court, or (ii) have been decided ‘in a way that conflicts with relevant decisions of this Court.’ One thing certain, the Supreme Court rarely grants certiorari ‘when the asserted error consists of erroneous factual findings or the misapplication of a properly stated rule of law’” (Pinto, Valentina Mello Ferreira, op. cit., p. 8).

[15] “Others though seem less convinced that the writ of certiorari has fulfilled its promise of filtering the cases heard by the Supreme Court to those which truly discuss matters of high importance. Kenneth Starr, for example, a former clerk for Chief Justice Burger has argued that Justices are not paying as much attention to matters of high importance as they should and granting too much power to their clerks:

The court if abdicating its responsibility to select complex cases ‘of immense importance to business,’ as well as drastically reducing the number of cases accepted for review, due to two factors: (1) ‘a lack of attention by the justices themselves to the [certiorari] review process’, and (2) a ‘ceding of power to clerks who typically have never practiced law or otherwise been involved in the work of free enterprise. He additionally asserts that the Justices themselves’ rarely read the certiorari documents that parties go to great trouble and expense to prepare; that the law clerks do that for them” (idem, p. 9).

[16] “The lack of transparency has also been an issue of raised by critics of the certiorari practice. Due to the fact that the question of whether or not a case is ‘certworthy’ has been clearly stated as a ‘matter of feel,’ it is hard for practitioners to establish criteria for presenting their cases. The ‘Court's apparent disregard of its own standards’ has also contributed to the growth of internal and external criticism. Rule 10 has provided little guidance in helping practitioners to decide on the importance of issues for it is still too vague.

One of the strongest suggestions to increase transparency within the writ of certiorari practice has been that courts should be obliged to publish the reasons for denial of certiorari. While this step is not taken, researchers, scholars and practitioners struggle to infer evidence as to why Justices choose to grant and deny certiorari. Books of retired Justices and significant amounts of jurisprudence have been analyzed in an effort to determine the extent to which there is effective ‘criteria articulated in the Court's rule on certiorari’” (idem, p. 9).

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